O
confinamento assusta. A idéia de que se está preso num barco, em pleno
oceano, afugenta muita gente. Se, além disso, surge a perspectiva de não
se ter nada para fazer durante vários dias, a coisa fica pior.
Mas nesses
passeios de transatlântico você só ficará confinado se desejar; só
se quiser curtirá sua solidão, levando-a também sobre as ondas.
Você pode
se deixar ficar na cabine isolado, ou conectar seu confortável espaço
privativo ao mundo ligando a TV retransmitida por satélite. Ou pode
optar por isolar-se com a vista luxuosa do mar, deixando-se simplesmente
ficar nos tombadilhos. Pode ler a viagem inteira. Pode, enfim,
transformar seus hábitos, manias e idiossincrasias em navegadores. Mas
que não falta o que fazer, isso não falta.
O navio
tem cinco bares, todos bem montados, com serviço de primeira. E em cada
um, quase sempre simultaneamente, toca um conjunto. Os músicos, além de
bons instrumentistas acompanhando bons cantores, têm toda aquela manha
profissional no relacionamento com o público, tanto para atender as
solicitações musicais quanto para aturar os clássicos bebuns.
Existe
também um grande teatro, onde, diariamente, são apresentados os
indefectíveis shows “para turistas”, numa pasteurização cultural
ao som de sucessos, desde “New York, New York” a “I’ll
survive”, ao sabor de uma discutível variedade musical e mesmo de opções
sexuais...
Nesses
shows, além de um bom conjunto, que reproduz bem os arranjos conhecidíssimos
– de Ray Coniff a Santana, passando pelo rock e apelando para Michael
Jackson, Madonna ou mesmo os Beatles – destaca-se um balé, que além
de passos elegantes ou atléticos oferece o brinde de belas dançarinas
de pernocas de fora. Não faltam também trechos daqueles musicais cujos
ingressos foram ou são disputados pelos turistas em viagem aos EUA, indo
desde “Hair” a “O Fantasma da Ópera”, transitando por
“Catch” e “Evita”.
O primeiro
show é uma recepção aos passageiros. Um desfile de bandeiras é o
ponto alto dessa apresentação, com mais uma constatação da globalização
da mão-de-obra que compõe a tripulação.
Outro show
interessante é o que denominam “Coquetel do Comandante”. Aliás,
esse é um verdadeiro evento, previsto até nas instruções que se
recebe antes do embarque, recomendando que se leve roupas adequadas.
Nesse dia,
o que se vê por todo o navio são ternos, gravatas, vestidos longos e
cheios de brilho. Trata-se, claro, de uma imitação canhestra do que
acontecia no tempo em que transatlânticos eram o supra-sumo da elegância.
Se a coisa for vista com bom-humor, até que é interessante. Na entrada
do teatro do navio, lá está o comandante, com seu uniforme de gala,
tirando fotos com os passageiros que formam uma grande fila. E o coquetel
é seguido de mais um show, onde a tripulação, a começar por todos os
oficiais, é apresentada. As nacionalidades dos oficiais: um italiano, um
russo, dois espanhóis, dois gregos, dois portugueses e um brasileiro.
Além dos
bares e shows, têm-se as atividades de recreação. Diariamente, são
realizados jogos de conhecimentos gerais, mímica, bingo, etc. Muitas
dessas disputas são feitas em torno da piscina, situada lá no deck mais
alto, onde se toma banho com água... do mar! Os vencedores saem exibindo
seus troféus pelo navio.
Claro que
são diárias as sessões de ginástica aeróbica. Afinal, centenas de
passageiros desejam manter, fingidamente ou não, a boa forma, ao mesmo
tempo em que se empanturram com as cinco refeições diárias. Isso
mesmo, cinco: café da manhã, almoço, lanche da tarde, jantar e uma
ceia, servida até altas horas.
Bem, para
os que levam a coisa a sério, o navio tem uma academia bem montadíssima,
com toda aquela parafernália de última geração para as malhações, e
onde se pode andar na esteira olhando a imensidão do mar.
Outra atração
inevitável é o cassino, sempre lotado. É impressionante como tem gente
que adora seu azar, a ponto de levá-lo até quando viaja de férias!
Ah, nos
corredores perto da entrada do cassino, máquinas caça-níqueis não são
deixadas em paz. Parece que alguns fazem toda a viagem ali, sentados
naqueles bancos altos e desconfortáveis, diante das máquinas,
acalentando o sonho de ouvir aquele barulho de milhares de moedas caindo
depois que o sortudo conseguiu a combinação que lhe dará direito a uma
bolada.
Claro que
para a garotada também não faltam atrações. A galerinha fica o tempo
todo em atividade, atazanando e sendo atazanada pelos recreadores.
Para a
turma bem miúda, o navio tem um jardim-de-infância completo, onde a
meninada brinca na piscina de bolinhas, faz desenhos, tudo acompanhado
por professoras especializadas. Um paraíso, enfim, para os pais que
querem uma folga para curtir as atrações do navio.
Os jovens
têm um espaço próprio: a discoteca, situada no último deck superior.
Todas as noites, até lá pelas três da manhã, rola aquele som
infernal, um “bate-estaca” em meio à luz negra, onde a turma
“fica” e a noite segue.
Mas não
se assustem: um tratamento acústico da melhor qualidade impede que o som
altíssimo perturbe o restante do navio, que segue, impávido, cortando
as ondas.
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